Gazeta do Povo
O ministro Paulo de Tarso Sanseverino, do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), determinou que o Twitter e o Facebook removam 31 postagens que apontam o apoio do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) à ditadura de Daniel Ortega na Nicarágua. A censura judicial, de caráter liminar (provisório), atinge também um tweet da Gazeta do Povo, de 22 de setembro, com a notícia de que o regime de Ortega havia cortado o sinal do canal de notícias CNN naquele país.
Sanseverino atendeu a um pedido de censura da coligação de Lula, que alegou que, em conjunto, as postagens promoviam “reiterada campanha difamatória” contra o petista, “com o objetivo de incutir no eleitor a ideia de que ele persegue e ameaça cristãos, assim como seu aliado e amigo, o ditador da Nicarágua Daniel Ortega”. Na decisão, o ministro diz que as postagens, apresentadas ao TSE pela coligação de Lula, têm “conteúdos manifestamente inverídicos em que se propaga a desinformação de que o candidato Luiz Inácio Lula da Silva defendeu a invasão de igrejas, perseguiria os cristãos, bem como apoiaria a ditadura da Nicarágua”.
Em nota, a diretora da Gazeta do Povo, Ana Amélia Cunha Pereira Filizola, afirmou que a decisão é “censura pura e simples”. “A decisão do TSE contra as postagens nos perfis das redes sociais da Gazeta do Povo é, sem sombra de dúvidas, censura pura e simples. Derrubar conteúdos verdadeiros, e perfeitamente verificáveis, é prática de ditaduras. A decisão, no entanto, reacende a nossa vontade de continuar lutando para que a liberdade de expressão seja totalmente reestabelecida no Brasil, pois, infelizmente, não somos um caso único e inédito. Hoje vemos crescer cada vez mais a interferência de Judiciário contra a liberdade de imprensa. Vamos lutar contra a decisão arbitrária nas esferas cabíveis.”
Entidades como a Associação Nacional dos Jornais (ANJ) e o Instituto Democracia e Liberdade (IDL) também criticaram a decisão.
Para basear sua decisão, Sanseverino citou dispositivos do Código Eleitoral e de resoluções do TSE que dizem que não será tolerada propaganda eleitoral que “caluniar, difamar ou injuriar qualquer pessoa, bem como atingir órgãos ou entidades que exerçam autoridade pública”. A remoção dos posts também tem como base regra aprovada no fim do ano passado pelo próprio TSE, que veda “a divulgação ou compartilhamento de fatos sabidamente inverídicos ou gravemente descontextualizados que atinjam a integridade do processo eleitoral”. A matéria da Gazeta do Povo noticiava o fechamento da CNN na Nicarágua, fato amplamente conhecido.
“Na hipótese dos autos, em análise superficial, típica dos provimentos cautelares, observo que as publicações impugnadas transmitem, de fato, informação evidentemente inverídica e prejudicial à honra e à imagem de candidato ao cargo de presidente da República nas eleições 2022. As publicações transmitem de forma intencional e maliciosa mensagem de que o candidato Luiz Inácio Lula da Silva é aliado político do ditador da Nicarágua Daniel Ortega, e assim como ele será contra os evangélicos e irá perseguir os cristãos”, escreveu Sanseverino. A reportagem da Gazeta do Povo em questão não citava a perseguição a cristãos. Mas também é fato que a ditadura nicaraguense está cada vez mais violenta contra a liberdade religiosa.
O magistrado deu como exemplos postagens, indicadas pela defesa de Lula, publicadas por políticos e influenciadores digitais, contendo críticas a atos do regime de Ortega contra veículos de mídia e religiosos, alertando para o risco de Lula adotar medidas semelhantes no Brasil.
Entre os alvos da ação estão o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), o assessor internacional da Presidência da República Filipe Martins, o deputado federal Paulo Martins (PL-PR), o ex-secretário nacional de Cultura e deputado eleito Mario Frias (PL-SP), o deputado estadual Tenente Nascimento (Republicanos-SP), além de jornalistas e comentaristas políticos, como Rafael Fontana, Leandro Ruschel e Kim Paim.
No pedido de censura, a coligação de Lula alegou que é falsa a narrativa de que Lula apoia o regime de Ortega. Os advogados do ex-presidente dizem que ele “jamais demonstrou qualquer tipo de apoio ao regime da ditadura”. “Os representados propagaram conteúdo gravemente descontextualizado, buscando propagar fato sabidamente inverídico de que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva apoiaria medidas autoritárias realizadas pelo Presidente da Nicarágua Daniel Ortega”, diz a ação. Os advogados dizem ainda que Lula “sempre pautou sua atuação de modo a respeitar a liberdade de crenças e religiões”. Por fim, citaram agências de checagem que teriam desmentido boatos de que Lula censuraria padres, pastores e ameaçaria igrejas no Brasil.
Na parte em que pediu a remoção da postagem da Gazeta do Povo, a coligação de Lula alegou que o jornal tentaria “induzir ao pensamento de que o ex-presidente compactua com a ditadura”. “As publicações acima referidas buscam associar que o candidato Lula apoiaria veementemente um regime autoritário e que persegue cristãos, o que sabiamente é uma inverdade”, disseram os advogados de Lula na ação – a postagem e a notícia publicada pelo jornal não afirmam que o ex-presidente perseguiria cristãos.
A defesa de Lula também pediu que o TSE determinasse que todos os alvos da ação se abstenham de veicular conteúdos semelhantes. O ministro não atendeu a esse último pedido. Ele determinou que Twitter e Facebook removessem as postagens, sob pena de multa R$ 10 mil por dia. Todas as partes foram intimadas a se defender. O Ministério Público Eleitoral, que também opina nos processos de propaganda, ainda não apresentou parecer.