SEPULCRO
Valores eram vinculados à conta judicial antes mesmo do pagamento e da decisão judicial
Patrícia Neves e Maryelle Campos

A Operação “Sepulcro Caiado”, deflagrada na manhã desta quarta-feira (30) para apurar fraudes na Conta Judicial Única apontam que pagamentos de alvarás eram efetuados antes mesmo da comprovação das guias de pagamento. Conforme decisão judicial que embasou a ação policial, a “cronologia invertida” fica explícita. Ou seja, pagamentos e movimentações bancárias formalizadas antes mesmo da ocorrência dos fatos que as autorizariam. O esquema contava com a atuação de um servidor do Tribunal de Justiça de Mato Grosso que está foragido. O esquema pode ter lesado os cofres públicos em R$ 21,7 milhões.
O delegado Pablo Carneiro, responsável pelas investigações afirmou ainda que em parceria com o TJ, irá realizar um verdadeiro ‘pente fino’ em processos. Ponderou que o caso, certamente, terá desdobramentos.
Conforme decisão judicial, um dos exemplos mais ilustrativos do esquema aponta um comprovante de pagamento no valor de R$ 119.013,89 datado de 23 de abril de 2021. No entanto, a vinculação desse valor à conta judicial única, especificando o processo ao qual seria destinado, foi realizada no dia anterior, 22 de abril. A inversão dos prazos levanta suspeitas de falsificação e manipulação de documentos oficiais.
A situação se agrava quando se analisa a sequência de atos processuais. A manifestação do advogado responsável, comunicando o pagamento e abrindo mão do prazo recursal, só foi protocolada em 4 de maio daquele ano. Já a decisão judicial que autorizaria a vinculação dos valores foi proferida apenas em 10 de maio. Na prática, o valor foi vinculado antes mesmo do pagamento, da manifestação da parte e da autorização judicial, indicando, segundo os investigadores, acesso privilegiado a informações extraprocessuais – possivelmente por meio de servidores públicos atuando em conluio com advogados.
Outro ponto crítico se refere à tentativa de encobrir a fraude com documentação aparentemente regular. A decisão revela outro processo, no valor de R$ 49.350,02 com uma data de entrada registrada como 20 de abril de 2007. No entanto, o comprovante de pagamento referente a esse valor foi anexado apenas em 23 de abril de 2021. A discrepância reforça a tese de manipulação de registros e adulteração de dados.
A operação:
Foram expedidos o total de 11 mandados de prisão preventiva , 22 mandados de busca e apreensão, 16 ordens de bloqueio judicial totalizando mais de R$ 21,7 milhões, além de 46 quebras de sigilo fiscal e bancário e sequestro de 18 veículos e 48 imóveis. As ordens judiciais são cumpridas em Cuiabá, Várzea Grande e na cidade de Marília (SP). Já foram presos sete advogados.
O grupo criminoso ajuizava ações de cobrança e, sem o conhecimento das partes rés, simulava a quitação da dívida via depósito judicial, juntando aos autos comprovantes de pagamentos falsificados.
Com isso, um servidor do Poder Judiciário, alvo da operação, fazia a migração do respectivo valor da conta única do TJMT para a conta vinculada ao processo, para que houvesse fundos para o resgate do alvará.