OPERAÇÃO HORTIFRAUDE
Por R$ 15, laranjas emprestavam nome para fraude milionária no comércio de hortifrúti
Patrícia Neves
Durante coletiva de imprensa sobre a Operação Hortifraude, a Polícia Civil de Mato Grosso revelou detalhes sobre o sofisticado esquema de sonegação fiscal que atuava no setor de hortifrutigranjeiros e já gerou um prejuízo superior a R$ 45 milhões aos cofres públicos. A ação foi desencadeada na terça-feira (30).
De acordo com os investigadores, o grupo criminoso criava empresas de fachada que jamais existiram de fato. Os “sócios” muitas vezes nem sabiam que estavam vinculados a um CNPJ e, em alguns casos, foram aliciados com quantias irrisórias apenas para ceder seus nomes.
“A empresa nunca existiu. Os sócios, às vezes, nem sabiam. Não pagavam tributo, era tudo falso, tudo ‘fake’. Eram empresas que só existiam no papel”, destacou um delegado que participa da apuração.
A tática consistia em abrir uma empresa, emitir notas fiscais frias simulando a venda de produtos como banana, por exemplo, e no mesmo dia encerrar suas atividades — abrindo uma nova, no mesmo endereço, repetindo o ciclo. Segundo a Polícia, o esquema envolveu mais de mil empresas.
Fraude em cadeia e créditos indevidos
As transações fraudulentas ocorriam entre empresas fictícias — classificadas como A, B e C — que simulavam vendas entre si. Mesmo sem existir produto ou operação real, as notas fiscais eram emitidas com destaque de ICMS, gerando créditos tributários indevidos para a próxima empresa da cadeia.
“Eles simulavam operações que nunca existiram. A empresa A emite nota para a B, destacando o ICMS. A B não paga porque nem existe, mas já acumula o crédito e repassa para a C. No final, alguém se beneficia pagando menos imposto do que deveria”, disse o delegado Walter de Melo Fonseca, titular da Defaz.
Essa cadeia de simulações permitia que atacadistas e destinatários finais acumulassem créditos e reduzissem drasticamente seus pagamentos de tributos, quebrando a competitividade do setor. “As maiores prejudicadas, além do Estado, são as empresas que operam corretamente. Elas não conseguem competir com quem sonega e distorce todo o mercado”, lamentou o policial.
Outro aspecto destacado pela investigação foi o aliciamento de pessoas em situação de vulnerabilidade. Segundo os policiais, havia casos em que indivíduos aceitavam abrir empresas em seus nomes em troca de apenas R$ 15.
“Eles ofereciam valores simbólicos para abrir uma empresa no nome de alguém. Muita gente só descobriu que era ‘sócio’ de uma empresa fantasma quando foi chamada pela polícia para depor.”
Os R$ 45 milhões já estão formalizados como dívida ativa do Estado, com as empresas de fachada listadas como devedoras. A Polícia afirma que esse valor ainda pode crescer com o avanço das investigações.
A Operação Hortifraude é coordenada pelo CIRA-MT (Comitê Interinstitucional de Recuperação de Ativos) e reúne Polícia Civil, Delegacia Fazendária, Secretaria de Fazenda (Sefaz-MT), Ministério Público e outras instituições. Mais de 13 pessoas já foram presas e 21 contadores identificados como envolvidos no esquema. A apuração continua e novas ações judiciais devem ocorrer nos próximos dias.