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Leis (e políticos) não possuem superpoderes

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O constituinte Antônio Britto dizia que, à época da Constituição de 1988, o momento no Brasil era de conferir a ela poderes divinos. Uma atitude romântica, guiada sob o lema “o que a gente escrever, acontecerá”. Passaram-se 30 anos e essa visão ainda não parece ter sido contestada pela sociedade brasileira, tampouco por seus políticos.

Isso porque nem sempre as políticas adotadas pelo Estado alcançam o resultado esperado. Não raramente, causam o oposto ao desejado, o que na Economia convencionou-se chamar de “Lei das Consequências não Intencionais”. Um dos exemplos mais famosos é o chamado Efeito Cobra, relatado pelo economista alemão Horst Siebert.

O governo britânico, preocupado com o aumento do número de cobras venenosas em Deli, na Índia, ofereceu uma recompensa para cada serpente morta e entregue às autoridades. Em um primeiro momento, a estratégia pareceu ser bem sucedida, haja vista a grande quantidade de serpentes mortas sendo entregues.

Todavia, oficiais ingleses descobriram posteriormente que empreendedores locais, considerando a rentabilidade do programa de recompensas, passaram a procriar cobras. A despeito de o governo ter abandonado a política, o resultado dela foi o aumento da população selvagem de cobras.

Incidente semelhante ocorreu em Hanói, no Vietnã, durante o domínio colonial francês. O regime colonial criou um sistema em que pagaria determinado valor para cada rato morto. Para obtê-lo, as pessoas tinham de fornecer o rabo do animal decepado. Depois de certo tempo, no entanto, funcionários coloniais começaram a notar a existência de muitos roedores vivos, embora sem caudas. Descobriram que os coletores vietnamitas capturavam os ratos, cortavam-lhes as caudas e então os liberavam de volta aos esgotos a fim de que pudessem se reproduzir e gerar mais ratos, aumentando assim suas receitas.

Dessarte, o Efeito Cobra passou a ser sinônimo de quando uma tentativa de solução para um problema acaba por, em última análise, agravá-lo.

A situação ilustra bem o que ocorreu no Rio de Janeiro após a proibição do canudo de plástico, ocorrida em julho de 2018. O pacote do canudo biodegradável, apontado como substituto ecologicamente correto, custava 28 vezes o preço da opção de plástico, além de pouco ofertado no mercado. Dessa forma, os comerciantes passaram a substituir o canudo original por garrafas e copos de plástico, ocasionando ainda mais danos ao meio ambiente.

Outro exemplo de Efeito Cobra foi a PEC das Domésticas, aprovada pelo Congresso Nacional há sete anos. A partir da obrigatoriedade de alguns direitos trabalhistas, antes opcionais, ela prometia melhores condições de trabalho a quem atuava na área. De lá para cá, porém, a taxa de informalidade do setor aumentou consideravelmente, sendo atualmente quase o dobro da média nacional da economia informal.

Soluções simplistas para problemas complexos podem levar a muitas consequências não intencionais. Portanto, faz-se necessário respeitar e estudar a complexidade dos fenômenos antes de se proporem resoluções que podem piorar o status quo, ao invés de melhorá-las. Por melhores que sejam as intenções de um projeto, elas não se concretizarão tão somente com a aprovação de uma lei.

Ainda sob a perspectiva da legislação brasileira, outro constituinte, Jorge Bornhausen, confessou a pretensão dos juristas, bem como a falta de preocupação destes para com os verdadeiros efeitos da Constituição: “consideramos o Estado todo-poderoso, capaz de resolver a saúde e a educação de todos os brasileiros. Houve certo utopismo”. Uma lição ainda a ser aprendida por boa parte das autoridades brasileiras: políticos não são super-heróis e leis não têm superpoderes.

 

Luan Sperandio é editor-chefe da casa de investimentos Apex Partners, analista político e colunista da Folha Vitória. Integra diversas organizações ligadas ao desenvolvimento de instituições com melhor ambiente de negócios, como o Ideias Radicais, o Instituto Mercado Popular e o Instituto Liberal. É associado do Instituto Líderes do Amanhã.

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